Primeira travesti mestra pela UEM usa figura da drag queen para discutir educação mais receptiva às diferenças
Primeira travesti a conquistar o título de mestra pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), no norte do Paraná, Lua Lamberti de Abreu, de 24 anos, usou na pesquisa a figura da drag queen para discutir uma educação mais receptiva às diferenças.
Em uma defesa de dissertação performática, na última sexta-feira (22), Lua foi montada de Galathea X, a drag queen dela. A jovem concluiu o mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da UEM.
Formada em artes cênicas, Lua disse que considerou em sua pesquisa o fato de as pessoas trans não serem bem-vindas aos espaços da educação e abordou a inclusão ao invés da exclusão desses estudantes.
“É um fato que as pessoas trans não são bem-vindas nesses espaços educacionais. Nem na escola, nem na universidade, nem na pós-graduação. O fato de eu ser a primeira já ilustra isso. Porque não fui eu que inventei o mestrado, não fui eu que inventei ser travesti, portanto, onde estavam as outras?”, pontua.
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Segundo a jovem, ela pensou na figura da drag queen, como alguém que usa a arte para agregar elementos externos e se “transformar” em uma pessoa diferente. Esta foi a forma encontrada pela pesquisadora para abordar uma possível transformação também na pedagogia, que chamou de “Pe-Drag-Ogia”.
“É pensar em formas inventivas de fazer uma pedagogia que seja convidativa e não violenta, que seja plural e não diferenciada – no sentido de diferenciar pessoas, no sentido de respeitar e positivar essas diferenças”, afirma.
A professora Eliane Maio, orientadora de Lua, explica que essa exclusão social, que pode começar na escola e levar as pessoas trans para as ruas, contribui para uma triste estatística: a estimativa média de vida de travestis é de 35 anos no Brasil, enquanto, segundo ela, a estimativa média de vida da população em geral chega a 80 anos.
“Como a escola vê essa pessoa drag? Como que se aprende a ser drag? Quem ensina e quem expulsa? Então o olhar do trabalho da Lua é isso: é dizer-se uma pessoa drag. E o que a escola tem feito nesse contexto? Atrapalhado, acolhido, expulsado?”, questiona.
De acordo com Eliane, há seis anos, ela colaborou com a criação de uma portaria na UEM, que possibilita o uso do nome social por estudantes trans. A professora destaca ainda que, até hoje, quatro travestis e um homem trans concluíram a graduação.
Lua, que iniciou o processo de transição para travesti justamente durante a graduação, afirma foi privilegiada porque recebeu muito apoio.
“Tive uma família que não me violentou, que me entende e que me aceita. São acessos que, infelizmente, nem todas as pessoas trans têm”, afirma.
Eliane destaca ainda a importância de dar visibilidade para as pessoas trans, e a luta dela para que as pessoas ocupem o lugar que querem ocupar.
“Quanto mais visibilidade, a gente vai rompendo estereótipos, preconceitos, paradigmas. A gente abre os olhos contra os preconceitos, isso é o mais importante”, disse.
E foi rompendo paradigmas que Lua usou na pesquisa dela uma metodologia feminista, na qual optou por autoras mulheres que discutem os temas abordados. Ela ainda convidou para a banca avaliadora da dissertação a doutora Megg Rayara Gomes de Oliveira, a primeira travesti negra conquistar o título de doutora na Universidade Federal do Paraná (UFPR), em 2017.
“Ser diferente não é um problema – então a gente precisa entender as diferenças e não anulá-las e não normalizá-las. As pessoas não precisam ser corrigidas, elas precisam ser ensinadas, e para isso funciona a educação”, conclui Lua.
Dia Nacional do Orgulho Gay
Nesta segunda-feira (25), é comemorado o Dia Nacional do Orgulho Gay. Para Lua, mais que comemorar as conquistas, o dia é uma forma de honrar as pessoas que morreram justamente por fazerem parte de grupos minoritários, seja da comunidade LGBT, de movimentos feministas e antirracistas.
“É sempre uma luta de muita dor. A gente não faz movimento de orgulho porque a gente acha muito bonito ser quem a gente é. A gente faz porque a gente ainda acha importante ser quem a gente é, mesmo que as pessoas queiram a gente mortas por isso. Então, isso é político, isso é importante”, declarou a mestra.
Lua ainda pontua que é feita uma comemoração em um sentido mais carnavalesco para positivar as outras vidas e demonstrar que, mesmo com todas as dificuldades, ninguém vai desistir de lutar.
Para a jovem, o fato de a defesa da dissertação de Lua ter acontecido perto do Dia Nacional do Orgulho Gay e no momento político atual, também teve um peso.
“Quer dizer que com todas essas investidas contra os direitos humanos, contra a questão LGBT, contra o estudo de gênero de maneira geral, a gente ainda assim faz um esforço de estar lá, de existir e de afirmar nossa presença, nosso lugar, nossa competência, nossa produção de ciência”, destaca.
Primeira travesti mestra pela UEM usa figura da drag queen para discutir educação mais receptiva às diferenças
Reviewed by Alexandre Meireles
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março 25, 2019
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